quinta-feira, 12 de junho de 2008

A experiência do contato...


“Olha lá o que vocês vão fazer com isso, hein meninas! Vão fazendo as perguntas, se eu souber responder eu respondo!” Foi nesse tom bem humorado que Marli de Oliveira Santos (ver abaixo) recebeu nosso grupo no Solar dos Estudantes onde trabalha. Na hora de tirar fotos mais brincadeiras: “Ah, olha só o jeito que eu estou! Espera porque eu tenho que passar batom, colocar aqueles brincos enormes, salto alto, vestidinho!”

À princípio, ia nos respondendo de forma tímida e direta, enquanto fazia a limpeza de um dos quartos. Aos poucos, a posição rígida entre entrevistadores e entrevistado foi dando lugar a um bate-papo descontraído e bem humorado e acabamos por nos desprender do roteiro de perguntas. Conversamos por mais de uma hora sobre diversos assuntos. Marli nos contou sobre sua vida antes de chegar em Campinas, sua família, os preconceitos e dificuldades na profissão, sua vida pessoal, os dias de folga, os planos para o futuro. Já não era mais necessário perguntar, tudo ia correndo de forma natural e espontânea. É interessante perceber como uma conversa pode render muito mais quando nos deixamos ficar à vontade.

Foi assim que conseguimos perceber com mais clareza os sentimentos e expressões, os sonhos e angústias, o dia-a-dia e a personalidade, modificando muitas daquelas pré-concepções que tínhamos a respeito das empregadas domésticas. Conseguimos enxergar além daquela imagem de mulher sofrida e marginalizada, descontente com o serviço que faz, conformada com sua falta de oportunidade. Marli, mais do que falar, conseguiu demonstrar o amor que sente pelo que faz, refletido no serviço cuidadoso e caprichado, nas brincadeiras e risos durante o trabalho, nas conversas com os moradores das kitnets. Também nos surpreendeu quando disse que pretendia fazer muitos cursos e que, mesmo com alguns problemas, considerava cada uma das pessoas que conheceu no Solar dos Estudantes como se fossem sua segunda família.

Se é possível dizer o que mais nos marcou ao longo desses meses de trabalho, talvez tenha sido a percepção do quão difícil é definir um grupo e escrever sobre ele sem cair nos esteriótipos. O contato mais próximo nos fez perceber que, apesar de representarem um grupo e uma categoria profissional, cada uma dessas empregadas domésticas têm seu jeito, seus gostos, seus sonhos, suas histórias, enfim, suas particularidades. Umas mais sérias, outras mais brincalhonas (como Marli), mas se é possível traçar uma característica comum, talvez seja a simplicidade com que essas pessoas demonstraram encarar os desafios da profissão.

Por fim, podemos dizer que ao sair com o intuito de buscar características comuns que definissem a identidade de um grupo, acabamos por voltar enriquecidos com o que as particularidades e as diferentes experiências podem nos oferecer!

quinta-feira, 5 de junho de 2008

Visitando o Sindicato em Campinas...

Quando conversamos com Marli de Oliveira Santos ( do Solar dos Estudantes, ver abaixo) pudemos entender um pouco mais sobre o dia-a-dia de uma empregada doméstica. Mais do que mudar concepções, também nos surpreendemos ao perceber o quão pouco elas conhecem sobre as leis, sindicatos e direitos que regem a vida de sua categoria profissional:
A gente só lembra quando precisa, essa é a verdade. Eu até conheço alguns direitos, mas muito poucos. Nunca fui ao sindicato, porque nunca precisei. "
Pensando nisso, o grupo decidiu ver de perto como funciona o Sindicato dos Trabalhadores Domésticos de Campinas, e assim pudemos conhecer ainda mais a história de luta dessa classe! Esperamos que esse trabalho consiga trazer algum conhecimento e clarear um pouco as dúvidas de nossas trabalhadoras!


Sede do Sindicato em Campinas






72 anos de lutas no Brasil e 41 em Campinas.
Algumas conquistas e muito pelo que lutar.

Localizada no final da rua Ataulfo Alves, camuflada entre as casas simples da Vila Castelo Branco, a sede do Sindicato dos Trabalhadores Domésticos de Campinas faz parte da historia de lutas dessa classe dentro do país. A figura de uma mulher sofrida e batalhadora surge nas bases desse sindicato, Laudelina Campos Mello, fundadora da primeira associação de trabalhadoras domésticas do país (em Santos-1936) deixou sua casa, de numero 396, para uso conjunto da categoria.
Seu nome também está ligado à transformação, na década de sessenta, do que era uma simples associação de mulheres em busca de um reconhecimento do grupo, em organização sindical em 1988.
Filiada a CUT, abrange as cidades de Campinas, Paulínia, Valinhos, Sumaré e Hortolândia, e se mantém por meio da colaboração voluntária-cinco reais mensais- de seus associados e também algumas parcerias com vereadores, deputados e outros sindicatos (como o dos metalúrgicos que contribuem com a divulgação dos boletins e materiais informativos). Devido à dificuldade de acesso à sede do sindicato, as reuniões mensais realizadas todo terceiro sábado, são realizadas no salão do Sindicato da Construção Civil, localizado na Rua Barão de Jaguara, centro, Campinas.
São 41 anos de luta pelos direitos dos trabalhadores domésticos. A primeira conquista da classe foi o registro em carteira, que é valido desde 1972. Em 2008 comemora-se 20 anos da concretização de direitos como: 30 dias mais um terço de férias remuneradas, 120 dias de licença maternidade, 13º salário, vale transporte, aviso prévio, jornada de 8 horas, descanso semanal remunerado e pagamento do INSS. A maioria desses direitos foi conseguida “na prática”, como relata Regina Simião, atual Secretária Jurídica, que participa do grupo muito antes de sua fundação.
A eleição da diretoria é feita de três em três anos. Os sócios são convocados e devido à dificuldade para se dirigir até a sede, o sindicato faz uso de uma urna itinerante, ou seja, visita vários bairros da região. Atualmente a diretora é Maria Regina Teodoro, que finaliza seu mandato em 2009.
Para se filiar ao Sindicato, o trabalhador deve ir até a sede, onde passa por uma “formação”, um tipo de conscientização sobre a importância do compromisso com o sindicato, com a luta da classe que ele representa e também da contribuição mensal. Procura-se não associar as trabalhadoras somente “no papel”, ou seja, deve haver envolvimento nos eventos do Sindicato( bingos, chás, feijoadas, confraternizações,bazares).

Regina Simião e trabalhadora doméstica


A comunicação e o sindicato

A divulgação dos eventos sindicais - como reuniões, assembléias, congressos, discussões - é feita por meio de cartazes, jornais, rádios comunitárias, além da distribuição de panfletos em pontos estratégicos (terminais de ônibus, porta de creches e condomínios), e do envio de cartas às filiadas.
Nenhuma informação sobre o sindicato é passada por telefone. De acordo com Regina, tal procedimento se dá devido ao grande número de patrões, que se passando por empregados, ligam no sindicato em busca de informações. Desta forma o trabalhador doméstico deve ir até a sede para ser orientado, diretamente, a respeito de seus direitos. Hoje o sindicato não tem outra maneira de orientar quem os procura, por isso Regina diz que cada um deve ser “fiscal” de seu próprio trabalho e não deve ter medo de relatar os eventuais problemas e ameaças que venha a ter no ambiente de serviço. È somente assim, contando com a colaboração e conscientização do trabalhador, que o sindicato poderá atuar de maneira ativa na vida da classe que visa representar. É preciso aderir à causa de sua classe para poder reivindicar seus direitos.
De acordo com ela, quando há relatos de problemas no ambiente de trabalho, o Sindicato procura encaminhar o filiado a um advogado, se for o caso, ou ainda, se compromete a acompanhá-lo até os órgãos competentes.
Ao receber uma trabalhadora na porta da sede do Sindicato, Regina diz: “Não pode sair daqui sem o boletim”. E alerta, ainda para a necessidade de comparecimento às reuniões sindicais: “O horário de atendimento hoje está encerrado. Vamos atender àquelas que tiverem mais compromisso com a nossa luta”.
A respeito das filiadas, diz que muitas só procuram o Sindicato quando estão com problemas e querem seus direitos garantidos. Mas são poucas as que freqüentam assiduamente as reuniões mensais e contribuem com o pagamento todo o mês.
Os interessados em conhecer, contribuir e ainda provar uma deliciosa feijoada, podem comparecer na sede de Campinas no dia 13 de Julho para a confraternização. Mais informações no telefone: (19)3229-1377.