quarta-feira, 14 de maio de 2008

Um dia de serviço: O grupo acompanhou de perto o trabalho de uma delas...



Não é difícil saber quando ela está por perto. As batidas na porta acompanhada do grito de “Limpeza”; as conversas e as risadas nos corredores; os dois baldes coloridos, os produtos de limpeza, a luva cor de laranja, a vassoura e a “caixinha”de chaves sempre à porta; Não tem como confundir! É a Marli que vem chegando para dar conta do serviço!
No “Solar dos estudantes” – prédio de kitnets localizado no Parque das Universidades, na cidade de Campinas-SP – Marli de Oliveira Santos, 37 anos, chegou para trabalhar a quase um ano e meio. Vinda da pequena cidade rural de Junqueirópolis, no oeste do Estado, Marli diz ter se mudado para trabalhar porque “lá onde morava só tinha plantação de cana. Não tinha serviço. O pouco que tinha era para lavar roupa ou trabalhar em casa de família, mas ganhava muito pouco então não compensava”. Trabalhou com serviço doméstico durante 10 anos em Sorocaba e de lá só saiu porque estava cansada de ficar longe dos pais e das cinco irmãs. Toda a sua vida sempre trabalhou como empregada doméstica e diz adorar o que faz: “Para começar, se eu não gostasse de tanta limpeza como eu gosto, não estaria aqui”!

No Solar dos Estudantes, o dia começa às seis da manhã. No seu quarto, Marli levanta e toma o café. Depois, tem que sair para apagar a luz da garagem. Volta para seu quarto e por lá fica passando roupa até mais ou menos oito da manhã, hora que o pessoal morador das kitnets começa a sair para estudar ou para ir ao trabalho. É então que Marli pega os baldes, a vassoura, os produtos, as flanelas e a sua famosa “caixinha” com as chaves de todos os quartos, o controle do portão automático da garagem, o celular e o telefone da Kitnet, e dá início ao serviço de limpeza. Ela tem que dar conta dos 17 quartos do prédio, devendo limpar cada um deles duas vezes por semana e recolher o lixo todos os dias. Além disso, tem que manter limpa a sala de TV e a cozinha comunitárias, a garagem, os corredores, a entrada do “Solar” e o próprio quarto. “Tem que sobrar um tempinho para eu limpar o meu quarto, que eu limpo só à noite. Eu faço questão, porque quem passa o dia inteiro na limpeza, ter que voltar para o quarto sujo, pelo amor de Deus!”. Marli diz ter que limpar pelo menos sete quartos por dia para dar conta de todo o serviço e atingir, até o final da semana, a meta de limpeza (duas vezes por semana cada um dos quartos). Como ela mora no mesmo local do trabalho, o seu horário é mais flexível, então pode levantar mais tarde e prolongar o serviço até à noite ou vice-verso, dependendo da programação do dia. Assim, diz que muitas vezes vai dormir só depois das onze da noite. Além da limpeza, Marli também tem que atender o interfone, o telefone, receber o correio, o eletricista, o encanador. Diz tentar resolver todos os problemas, exceto os mais graves que devem ser noticiados ao escritório da imobiliária que administra o prédio. Problemas como o barulho excessivo dos estudantes moradores e a falta de colaboração na manutenção da limpeza devem ser repassados ao escritório. “De vez em quando eu fico estressada porque é muita coisa e eu tenho que tentar resolver tudo. Mas eu gosto de estar sempre brincando. Não é porque você não está bem que vai tratar mal os outros. Tem que manter a calma.”. O bom-humor, o cuidado e a calma para fazer o serviço bem feito são características notáveis no dia-a-dia de seu trabalho. “Falam que eu sou caprichosa, e eu gosto mesmo de fazer tudo direitinho, sem pressa. Acho que tem muito a ver com você gostar do que faz”. O tempo todo conversa e brinca com os moradores, enquanto vai dando conta da limpeza do dia. “O serviço às vezes até atrasa porque eu gosto de ficar conversando e sabendo das coisas. Eu adoro isso!”. Mesmo com tanta alegria e dedicação àquilo que faz, Marli afirma que a saudade que sente de sua família é o aspecto mais difícil da sua profissão. “É uma coisa que eu não gosto nem de pensar. Ainda bem que eu não tenho tempo pra isso. Tenho muita saudade da minha casa, do meu cantinho.”



Apesar do serviço puxado de domingo à sexta, Marli valoriza muito o estudo e diz que pretende arrumar um tempinho para fazer um curso e aprender a mexer no computador: “Eu já fui atrás e vi que tem de todos os preços. Não é tão caro, dá pra fazer sim. A princípio vou fazer só o de informática, depois se for aparecendo outros eu vou fazendo também”. Nos sábados – dia de sua folga - Marli costuma visitar uma de suas irmãs que mora em Campinas, também gosta de sair para dar umas voltas no centro da cidade ou para passear com algumas amigas no shopping.
Quando perguntada sobre filhos e casamento, diz estar solteira e muito feliz, e brinca: “Já tenho 17 filhos, não está bom não? Eu gosto muito de cada um deles. É como se fosse minha segunda família”. O amor que diz ter pelo que faz se reflete claramente no serviço cuidadoso e nas brincadeiras constantes no ambiente de trabalho. Os moradores do “Solar dos estudantes” agradecem.

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